A família de Enzo Veiga Guimarães, de 4 anos, comemora a descoberta de dois doadores de medula óssea, que são 100% compatíveis com ele. O garoto foi diagnosticado com uma condição raríssima, chamada “deficiência de purina-nucleosídeo fosforilase”, que causa imunodeficiência e problemas neurológicos.

“A partir de hoje, eles também fazem parte do meu filho. São da família, porque vão ajudá-lo a renascer”, celebra Marcelo Veiga de Souza, de 56 anos, pai da criança, em referência aos doares. Enzo ainda ará por alguns exames no decorrer de maio e deverá fazer sessões de quimioterapia e manter uma dieta mais calórica para se fortalecer para o transplante.

"Se eu pudesse falar com os possíveis doadores neste momento, eu agradeceria do fundo do meu coração a quem está salvando a vida do Enzo. Porque, a partir deste momento, serão como mãe e
pai para ele, pois estão devolvendo a vida para o meu filho", completa.

Morador de Nepomuceno, no Sul de Minas, o garoto vive uma batalha desde que os primeiros sintomas surgiram. A história começou com uma gripe comum, que atingiu também a irmã mais nova, Antonella, de apenas 1 ano. Com o tempo, o quadro da menina piorou, levando-a à internação em uma unidade de saúde em Lavras, também no Sul do Estado, e à transferência para um hospital pediátrico em Belo Horizonte.

Foram 40 dias sem diagnóstico até sua morte, no dia 1º de dezembro de 2024, com apenas 1 ano e 8 meses de idade. Pouco tempo depois, Enzo começou a apresentar os mesmos sintomas: perda de coordenação motora, dificuldade para se alimentar e enfraquecimento.

“A Antonella teve uma gripe, e ados três meses ela foi enfraquecendo. Ela era normal e perfeita. Aí o Enzo começou a adoecer, e os médicos mandaram a gente procurar um geneticista”, conta Marcelo. A confirmação da doença veio com exames feitos em São Paulo e analisados por bancos genéticos internacionais.

Corrida contra o tempo. Há dois meses internado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Enzo não anda, não fala e depende de sonda para se alimentar. “Ele era perfeito, brincava, jogava bola e hoje ele não fala nem ‘pai’, nem ‘mãe’ mais. Não tivemos tempo de viver o luto da minha menininha e hoje precisamos correr contra o tempo”, desabafa o pai.

Sem compatibilidade entre os familiares, a esperança foi renovada por meio de uma campanha em busca de doadores que se espalhou por todo o Estado. “Se eu pudesse falar com os possíveis doadores neste momento, eu agradeceria do fundo do meu coração a quem está salvando a vida do Enzo. Porque, a partir deste momento, serão como mãe e pai para ele, pois estão devolvendo a vida para meu filho”, desabafa. (Com Juliana Siqueira, Raíssa Oliveira e Raquel Penaforte)

Compatibilidade é de um caso a cada 100 mil

A procura por um doador é feita pelo Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome), banco de dados que reúne pessoas que se cadastraram para doar para pacientes que precisam de transplante. Atualmente, o número de doadores no sistema é de 5,9 milhões de pessoas. Mas encontrar compatibilidade não é simples. Entre desconhecidos, a possibilidade vai para um caso em cada 100 mil.

Dados do Ministério da Saúde apontam que, em 2024, o Brasil registrou 5.745 transplantes de medula óssea, sendo 3.760 do próprio paciente (autólogo), 1.610 de parentes de pacientes (aparentado) e 375 de pessoas que não têm ligação sanguínea com o paciente (não aparentado). Atualmente, há 650 pessoas à espera de um doador para a realização do transplante no país. O tempo médio de espera para encontrar um doador é de dois meses.

O analista da Assessoria de Captação da Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia do Estado de Minas Gerais, Thiago Sindeaux, explica que a doação é essencial, pois pode ajudar pessoas muito distantes do doador original. “O Redome é o terceiro maior banco de pessoas cadastradas como doadoras de medula no mundo. A análise também é cruzada com doadores de fora do país. Por isso, é preciso ter em mente que você pode ajudar pessoas de qualquer local do mundo”.

O que é a deficiência de purina-nucleosídeo fosforilase

Conforme o Ministério da Saúde, a doença é considerada uma rara deficiência autossômica recessiva, caracterizada por imunodeficiências com grave disfunção das células T (tipo de glóbulo branco) e sintomas neurológicos frequentes. O tratamento só é possível com transplante de medula óssea ou de células-tronco.

Rara no mundo. A deficiência de purina-nucleosídeo fosforilase, doença que acometeu os irmãos Enzo e Antonella, causa espanto até aos médicos, segundo conta Marcelo Veiga de Souza, pai das crianças. Os profissionais relatam que nos Estados Unidos são cerca de cem casos, enquanto no Brasil há menos de 30.